quarta-feira, 15 de junho de 2011

De quem é a credibilidade?

Muito se fala sobre credibilidade desse ou daquele veículo de comunicação, mas pouco se diz de quem é essa credibilidade mesmo. Nem mesmo os jornalistas se dão conta da força e do peso que dão aos veículos.
Sempre pensei que difundir notícias é um privilégio e uma responsabilidade e vi essa idéia cristalizada no filme ‘Encontro marcado’, em frase dita pelo personagem interpretado por Antony Hopkins, proprietário de um conglomerado de comunicação. Mas o que poucos atentam é que o privilégio é dos donos dos veículos, que amealham um grande patrimônio, e a responsabilidade fica por conta dos seus profissionais que, literalmente, constroem esse patrimônio.

Um dado rápido para essa afirmativa é ver quantos proprietários de veículos de comunicação são processados ou presos. Nenhum! E quantos profissionais de comunicação são processados, ou presos ou mortos por reportagens feitas? Passam dos milhares. Não se tem um dado preciso. Mesmo em tempos de ditadura, apenas os profissionais iam para o xadrez enquanto os donos eram apenas convidados a sair do país, no máximo.

Eu me recordo de uma vez que fui visitar o jornal Diário do Amazonas, ainda quando o seu proprietário, Cassiano Anunciação, o Batará, figura folclórica e lendária do jornalismo amazonense, semi-analfabeto, passava as tardes de domingo na redação mesmo tendo uma bela lancha para passear no rio Negro, deixava os jornalistas na redação entre indignados e humilhados, quando dizia: “O diploma é de vocês, mas o jornal e o dinheiro é meu!”

Isso poderia me desviar para a discussão sobre a exigência do diploma e eu acabar fugindo do tema aqui, coisa muito comum entre meus colegas de profissão. Não acontecerá.

Olhando para o passado, devemos lembrar que a profissão de jornalista é recente e, quando a imprensa chegou ao Brasil, os poucos jornais eram escritos em sua maioria por médicos, advogados e outros profissionais que tinham formação suficiente para apresentar suas idéias sobre determinado assunto. Os jornais ganhavam mais credibilidade dependendo de quem escrevia para eles.

Guerra surda

Isso por si só reforça a tese de que não são necessariamente os detentores da tão propalada credibilidade. Mas devemos colocar em discussão e velha e boa guerra surda que acontece nas redações: o interesse dos proprietários versus a ética jornalista. Invariavelmente a segunda sai maculada ou o profissional é demitido. Já passei por isso! Melhor a rua que ver a informação ser vilipendiada, não acham?

Ora, os interesses do proprietário é apenas um: financeiro. A ética, sempre será uma e se adquire não apenas na academia, é algo que se traz de berço, por formação familiar. Não adianta estudar ética na academia se você não a tem em sua vida. Será apenas um livro na estante que servirá como álibi sem-vergonha: viu, eu estudei ética, tá?

E esse interesse dos proprietários invariavelmente está atrelado aos que estão no poder. Eu poderia citar o exemplo da rede Globo, que mudou o tratamento dado a Luís Inácio da Silva quando percebeu que este venceria as eleições em 2002 e deixou de destratá-lo ou sequer ouvi-lo, ou dar-lhe um espaço menor em seus noticiários. Prefiro me referir às manchetes dos jornais de Manaus (ou de qualquer outra cidade do país), que mostram suas tendências no período eleitoral, ou nos pseudo-programas mundo cão transmitidos diariamente pelos apresentadores candidatos. Sempre há algo intencional por trás das “séries de reportagens” mostrando um determinado problema da cidade.

É assim que é mascarado ao leitor/ouvinte/telespectador o interesse dos proprietários dos veículos de comunicação. Passa-se a idéia de que os casos de segurança, saúde, educação estão sendo tratados de forma correta. Com os internautas não funciona bem assim, já que a interatividade existe e não tem mediação, nem limite de tempo ou espaço.

Não podemos esquecer que de tanto se deixar de lado a importância de quem realmente é a credibilidade, foi se deixando crescer a ideia de que são os veículos de comunicação os detentores da credibilidade, que os profissionais foram aceitando essa idéia e passaram a não mais questionar isso. Pior que isso, passam a defender com todas as suas forças o veículo onde são escravizados, digo, trabalham. Mais horrível ainda, entram no jogo mesquinho e espezinhante  dos proprietários, que se divertem em suas lanchas, sítios ou que tais, enquanto ex-colegas de faculdade se alfinetam e se engalfinham atrás do “furo jornalístico”.
Alimenta-se a rivalidade dos profissionais enquanto os proprietários se confraternizam. Mais que isso, reparte-se os profissionais, enfraquece-se a categoria. Não à toa a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de não exigir o diploma para o exercício da profissão de jornalista foi aprovada sem nenhuma resistência. A categoria não é unida porque se queima na fogueira das vaidades. Querer trabalhar na Globo é delírio, ops, sonho, de muitos e a maioria está disposta a fazer absolutamente qualquer coisa para atingir esse objetivo.

Meus colegas comunicadores devem prestar atenção na dura realidade que os cercam. Todos os anos centenas de profissionais da comunicação são jogados no mercado de trabalho. Esse mercado é reduzidíssimo e já está saturado faz tempo.

Mais uma vez o mundo cibernético vai se mostrando como um espaço alternativo crescente, que não permite manipulação por proprietários. Naturalmente que por não possuirmos uma internet de qualidade (porque será, né?) a maioria da população não tenha acesso. Mas tem espaço para os profissionais que já foram devidamente sugados pelo sistema na rede mundial. Por isso há, nesses tempos, a alimentação de uma nova guerra: se for blogueiro, não tem credibilidade. Vi muitos colegas meus levantando essa bandeira sem nem ao menos se dar conta de que estavam sendo usado como o que eles mais combatiam: serem massa de manobra.

Prestem atenção meus colegas. Reflitam sobre a credibilidade que você dá ao veículo onde você trabalha. A discussão vai longe e está apenas começando. Certamente alguns aspectos não foram abordados aqui, mas cabe a você dar a sua contribuição.


4 comentários:

  1. Como sempre excelente texto!
    Achei mais interessante a parte do livro-álibi, afinal todos estudamos ética. Acho que jornalista que quer sair um pouco desse abuso cria blog e escreve o que bem entende. É claro que para atos há consequências mas ao menos a gente pode falar, ao menos um pouco.

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  2. meu amigo....que texto eih.
    gostei das palavras do teu colega “O diploma é de vocês, mas o jornal e o dinheiro é meu!”
    é sempre assim nao é? dinheiro X conhecimento...eles cobram qualificaçao quando eles próprios nao a possuem.

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  3. Ei mermão...este texto me lembra os tempos de meditação logo após de comer o rango do bandeijão do R.U. Lembra?

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  4. "Não adianta estudar ética na academia se você não a tem em sua vida".Gostei dessa parte e creio que ÉTICA e VALORES morais está ficando extinto no Ser Humano em alguns.
    Vale ressaltar, uma coisa que defendo quem faz comunicação social à deriva comete o mesmo crime de um médico ou advogado que exerce sem o registro ou seja, JORNALISMO vai além, de criar um blog e criticar, JORNALISMO é teoria, fatos, pesquisas onde aprendemos na faculdade e nos estudos do dia.
    Onde aprendemos a teoria da Agenda-setting ou seja, a Comunicação Social e os meios de comunicação colaboram na construção de ideias e sugestões de comportamentos ajudando as pessoas no fortalecimento da sua cultura e na valorização da identidade. Porém, também acarretam noções de alienação e distanciamento da realidade em que vivem, resultando-se num processo dialético.
    A mídia exerce um controle único sobre a sociedade isso é fato!

    Ana Clarissa

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